quinta-feira, 30 de julho de 2009

Dias de sol


Certo dia, mamãe chegou em casa com uma flor, não era bem uma flor, era mais que isso: era um girassol. Ela o colocou na beirinha da minha cama e disse:



_ Pronto! Agora será sempre dia. Nunca mais você precisará ter medo do escuro.


(...)


Demorei pra entender a importância de dormir e acordar constantemente a lado do sol.


Carla Abreu

terça-feira, 14 de julho de 2009

SobreVivência

Hoje espalhei alguns de meus velhos livros pela sala. Abri-os e deixei que respirassem o meu ar... e eu o deles.

Aos poucos os personagens foram se soltando das páginas e me vi conversando com Zezinho e seu Pé de Laranja Lima. Senti no rosto o calor dos Sonhos que embalavam as Noites de Verão de Shakespeare. Passeei com o Menino pelo Engenho. Admirei Tereza Batista dançando sozinha no tapete. Ao lado Basílio e Luísa se amavam, enquanto Emília filosofava com Macabéa sobre a redoma que o Príncipe menino colocara a Rosa. Chicó falava de Nossa Senhora para Nástienka que só pensava na sua margarida.

E eu? ah, fui matando a saudade de mim...

Carla Abreu

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Pensamentos Soltos I

* Seria o vaga-lume uma espécie de sinal das estrelas?

* Liberdade devia ser um estado de espírito e não de situação civil.

* Quando não sei pra onde ir, fico quieta. Tenho medo que o tempo me perca.

* Acendeu uma luz lá fora, no corredor. Vi pela fresta da porta. Não me atrevi alevantar. Fiquei quieta e ela logo se apagou, sem me chamar.

* Pegou a dor toda pra ela. Não havia mais nada além. E das sobras, uma fazia companhia pra outra.

* Meu de-lírio tem nome e forma. É uma flor branca, nasce emorre várias vezes por ano.

* Já nasci com as malas prontas. Não as desfaço nunca. Estou em constante partida. Só falta o destino escolher.

Meia Luz

Sempre tive medo do escuro. Quando pequena, era contido pelos braços de minha mãe. Ela dizia que com o tempo passava. Nunca passou!

Agora venho tendo medo do claro também. As coisa que vejo causam pânico aos meus olhos. O claro carrega consigo uma obviedade que me incomoda.

No escuro, ao menos dava pra pensar que os monstros eram só fantasia. No claro não! Tenhos-os visto sempre. Me aparecem assim, sem escolher a hora.

Ás vezes me assusto tanto, que resolvi comprar um regulador de intensidade da luz. Fico sempre no meio termo, à meia luz.

Será que existe um desses pra inquietude d'alma?

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Com-tradições

Olha, já sei que decidiu partir. Não que eu não soubesse há tempo, mas preferi ignorar mais uma de minhas nuances. Sabe querido, odeio ser intuitiva. Sofro antes, durante e depois dos acontecimentos. Li no seu olhar que aquela seria a última vez que me tocaria. E me desculpa a expressão, mas foi literalmente foda.

(...)

É estranho pensar que transar quando se está despedindo é quase melhor do que o sempre. Acho que inverteram os termos. Sonhava com a tal primeira vez e na verdade, cá entre nós, foi péssima. Preferi a última vez. De agora em diante, toda vez que me falarem de momentos marcantes aconselharei viverem o último. E você querido, foi um bom amante. Tudo bem que a gente sempre sonha mais. Mas até que eu estava satisfeita. Não vou mentir que às vezes sozinha, pensava em algo mais picante, libidinoso. Por favor, não me interprete mal, mas é que de um tempo pra cá comecei a querer mais do meu corpo. Entende?

(...)

Porém, quero que saiba que mesmo assim eu não o deixaria. Não sei ao certo o que me prendia a você. O sexo definitivamente acho que não era. Mas sei lá, eu queria estar ao seu lado. Na verdade eu ainda quero, mas não posso mais te impedir. Pensei até em parar de fumar, sei que não gosta muito e talvez até deixasse de beber a maldita vodka e jogar baralho com aqueles amigos no buteco, mas seria enterrar o resto de mim. Bem que minha mãe disse que isso não é coisa de moça de família. Só que agora não dá mais tempo. Já estou perdida nesse meio e pra falar a verdade, não acho justo te prender em minhas desilusões e delírios noturnos.

(...)

Tudo bem quanto a me deixar. Chorarei um dia, uma semana talvez. Eu só queria que soubesse que gostava de sua companhia. Você era aquilo que eu queria ter sido, mas nasci assim meio torta, admirando homens que falam de putas e lêem Bukowski. Não que eles tenham algo assim muito admirável ( alguns estão em estado deplorável) mas, me fascinam. Deve ter sido praga da minha vó quando minha mãe engravidou solteira e fugiu com meu pai. Deve vir daí meu interesse por coisas distorcidas e homens complicados.

(...)

Imagino o quanto foi difícil pra você passar noites me esperando chegar embriagada da rua querendo que você entendesse minhas idéias malucas sobre sexo a qualquer custo. Devo me desculpar por isso, sempre pensei que o sexo de alguma forma me libertaria. Mesmo sem saber ao certo a que estou presa. Entretanto, prometo que se algum dia conseguir largo essa vida e procuro melhores companhias.

(...)

Sei que logo ali na frente, encontrarás com uma dessas menininhas que os homens sonham. Aquelas que passam horas lendo revista sobre casais. Eu infelizmente vim na época errada, jamais te daria o privilégio de sentar e falar da cor de algum vestido. Até porque prefiro ficar quase sempre sem. E você não merece tanta frieza.

(...)

Vá querido, pode ir sem culpa. Se algum dia lembrar, mande um recado dizendo que está feliz. Gosto de saber da felicidade alheia, já que a minha se encontra cada vez mais distante.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Isolda que amava Tristão

Por tantas vezes havia o desejado assim e agora o tinha. Chegava enfim o ápice daquele encontro. Isolda jamais saberia ao certo se Tristão lhe pertencia ou se possuía apenas seu corpo, seu sexo. Mas o que importa pertencer ou não, quando as mãos se encontram em euforia no balanço dos quadris?

Tudo o que ela precisava ter naquele momento era dela. O olhar, o toque, o beijo, o desejo e o prazer de Tristão .E Isolda amava... Ah, ela amava com todo aquele clichê dos românticos e acreditava que podia ser pra sempre. E o que pode ser o “pra sempre” senão o agora?

É por isso se entregava, que se envolvia em meio àquelas pernas e desejava que ele a tomasse como se toma uma dose de cachaça pura. E que sentisse o calor que a queimava feito brasa e as batidas de bateria de escola de samba que seu coração entoava.

Isolda amava Tristão, mesmo quando, exausta, procurava seus ombros, ele se levantava, deixava o dinheiro na mesinha de cabeceira e não dizia uma só palavra.

E era aí que ela mais amava...

segunda-feira, 6 de julho de 2009

O motivo do blog se chamar Tilim Tino









Tilim


Há uma janela,

entre minha
cidade
e a dela,

por onde
conversam
asas.

abro,
espio

e as vejo em brasas
no balanço mineiro do sino;

também
Tilim tino

também
Tilim tino

também
Tilim tino

e passo
em desatino
ao outro lado:

- mas logo no coração,
Cupido Afobado?!
logo no coração?!


Anderson H.




domingo, 5 de julho de 2009

O silêncio do teu nome



“Eu protegi seu nome por amor...”
(Cazuza)


*

Hoje eu acordei medrosa, mas sem reclamar presença. Com dois ou três sustos pela casa e um cheiro morno de ilusão no corpo.
Dois olhos crus, duas noites perdidas, duas fagulhas de sorriso no rosto.

Um incêndio na alma.

Eu queria continuar, quis tanto tentar, mas entre nós dois restava apenas a boa educação, alguns gramas de literatura - barata - e dois versos rabiscados no chão escuro do quarto
Eu o vi tantas vezes atrás do que mais tentava esconder, eu penetrava em sua alma através do meu olhar. Cada gesto, cada palavra e o mel que as tomava me remetiam a sonhos e desejos inalcançáveis.

Sonhos com gosto das madrugadas... Indecifráveis

Por tanto crer em sua antiga canção, eu ganhei asas, assumindo o vão entre nossos corpos, como a visão panorâmica do paraíso.
Até restar de tudo, umas doses de uísque, uma cama desfeita e esse medo de rever meus antigos preconceitos.
Porque seus gestos me dizem demais.
De fatos e loucuras. De palavras insanas. Da sua arte que faz nascer cura ou morte, dependendo da forma como se pronuncia seu nome.

Esse que calei para proteger.

E por tamanha impossibilidade, decidi deixar calar sua voz que ressoa baixa, decidi não dançar seu sonho e nem gritar tão alto por você.

Pois, por amor, em segredo, te guardei.

Carla Abreu e Jessiely Soares.



Aborto

Maria levantou tarde. Era uma das poucas vezes que teve esse luxo. Decidiu não ir trabalhar.
Da sua janela via mais janelas. Por um momento pensou em ser um pássaro, voar até as mais altas e quem sabe mais perto do céu encontrar um pouco que fosse de conforto.

Desistiu.

Sentiu mais uma vez as fisgadas em seu ventre. Abaixou-se no canto da sala e implorou para que a dor aumentasse. Queria que aquela dor ultrapassasse a outra que rasgava o peito e a fazia delirar.

Maria nunca foi dada a delírios.Gostava mesmo era de “apalpar” as coisas da vida. Apesar de que, há algum tempo era a vida que a estava pegando e dava pra ver Maria sonhando acordada, cantarolando nas ruas, imaginando como seria entrar de branco e véu em qualquer padaria ou farmácia só pra mostrar pra todo mundo que havia se tornado “senhora dele”.

- "Quanta bobagem! "- pensava ela -.


A realidade era outra. Há dias só enxergava coisas marrons ao seu redor. As outras cores, aquelas que de em vez quando nossos olhos teimam querer ver, já não existiam mais pra ela.

Lembrou da dor... das dores...

Encolheu corpo e com a cabeça entre as pernas chorou bem forte. Não entendia porquê Deus não ouvia. Logo ela, sua Maria. Gritava, mas era vão.

Estava sozinha.

Levantou devagar, sentiu descer em forma de sangue pelas suas pernas o último gozo.

E só então, teve a certeza do fim.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Acasos de Érica

“_Acabou!”

Única frase que ela carregava na memória. Lembrava da voracidade com que aquilo foi dito e da certeza. No primeiro momento ela desacreditou. Pensou que era só tirar a roupa, acariciar suas partes e logo estaria ele, exausto em seus braços.

Há anos era assim, brigavam furiosamente, em seguida se amavam com a mesma fúria. Dessa vez não podia ser diferente, já conhecia os pontos fracos de Marcos. Na verdade não só os dele e sim da maioria dos homens que já havia se relacionado.

Para Érica isso já era costume, toda vez que alguém ameaçava ir embora, lá estava ela disposta a fazer algo pra agradar. Nunca soube perder. Certa vez se humilhara descaradamente pra um seus amores. Foi uma noite horrível, em que ela gritava e suplicava mais uma chance, e ele...infelizmente cedeu. Só Deus sabe como foi complicado mais um mês depois daquela cena, ela se sentia ridicularizada e mais frágil que nunca e não tardou para que ele a deixasse.
Mas agora era diferente, Marcos era outra pessoa. Com ele funcionaria e uma forma mais amável. Marcos jamais a deixaria depois um grande esforço. Precisava pensar rápido.

“- Ficar nua e implorar que ele me penetre não é tão humilhante assim.Ele me deseja ainda, isso é o que importa. Há menos duas semanas ele disse que ninguém o
chupava como eu, não era possível que ele tenha mudado idéia.”

E lá estava ela, pronta a se deixar levar pela loucura que o medo perder é capaz de proporcionar.

“_Olha Érica, eu queria te dizer...Não tá mais rolando entre a gente, você entende né?”

“_Meu amor é só uma fase. Eu sei que não estou sendo uma boa mulher, amante.Tenho tido alguns pudores.Mas...”

“_Ah querida, não é isso.Você é linda, te acho sexy, mas não rola mais.”

“_Lindinho, olha só o que preparei pra nós.Calcinha nova! Tô louca pra que a gente esqueça isso tudo, e olha dessa vez eu prometo que deixo você gozar na minha boca”

_”Mas Érica, em 3 anos namoro eu sempre quis isso e você dizia ter nojo.E não quero que seja assim por pressão.”

_”Claro que não Marcos, eu estava me preparando e só pra você ter certeza que não tem nada de pressão, deixo você me comer por trás também.”

"_O quê??? E aquele papo que se isso acontecesse antes do casamento, na lua mel não teríamos nada diferente pra fazer?

"_Pensei melhor amor, você merece isso e muito mais.”

(...)

No outro dia...

“_ Como assim Marcos, a Ritinha disse que você deixaria a Érica com certeza e que ia assumir o caso vocês?”

“_ Até vou, mas amigo, não é todo dia que uma mulher do nada resolve ceder a todas suas fantasias a troco você apenas dormir na cama dela.”

(...)


“_Não Ritinha, ele imagina que foi a primeira vez que fiz isso. Mas amiga, o Marcos até que merecia e depois ele me explicou que esse rompante me deixar era só um momento confuso que ele teve.Nada demais. Coisas homem. Ele se sentiu o único e por favor querida que ninguém saiba disso, mas aquela vez com o Ruy foi bem melhor.”

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Descoberta

Hoje acordei com cheiro de pitanga n'alma. Há tempos não sentia o corpo tão leve. Há tempos não vejo pitangas.

Minha relação com essa fruta começou bem cedo. Quando criança, minha mãe tinha mania de alergias. Tudo que eu respirava, ela dizia que me faria mal. A família inteira me evitava afinal, era impossível conviver com alguém alérgica a perfumes, poeira, lã, beijos, leite e por aí vai. Até que um dia, descobri o absurdo. Eu era alérgica a mato, "- qualquer tipo de mato e se sentir o cheiro de longe ela espirra-" disse ao médico. Agora, me diz como alguém pode nascer em uma cidade que 70% do seu território é composto de pastos, árvores, montanhas, todo tipo de verde possível e ser alérgica? Pois é, para ela eu era. Nem procurei descobrir como ela havia chegado à essa conclusão. Acreditei. Passava quase o tempo todo com medo. A qualquer espirro e apareciam os remédios, as
bombinhas, nebulizadores. Um tormento.

Com isso, os dias iam passando e eu cada vez mais sozinha. Meus primos me evitavam. Só
Amelinha brincava comigo. Eu sentia tanta inveja dela. Era a mais pobre de todos nós e a mais livre também. Brincava com os meninos. Corria. Caía. Brigava. E eu ali, olhando. Até que numa tarde, eu pedi a ela que me levasse para onde eles brincavam. Ela foi pro outro lado da rua, conversou com os garotos e voltou dizendo que eu poderia ir, mas que em hipótese alguma poderia chorar. Eu chorava por tudo. Percebei que só ela me queria ali, os meninos nem me olhavam. Eu precisava tanto do desconhecido. E ainda preciso. Então, eu fui.

Fui quase o tempo todo calada. A voz não saía, porém meus olhos transbordavam medo, ansiedade e alegria. Me disseram pra tirar o sapato pra correr melhor, mas preferi correr menos. Pensei na asma. Pensei nas
bombinhas.

Depois de alguns minutos andando, chegamos. Até hoje não sei o que foi aquilo que senti ao entrar com todos eles em meio a um pasto bem verde. O capim chegava ao joelho e cortava de leve as pernas. Senti cócegas. Eu ria por dentro. No início, tapei o nariz. Lembrei de mamãe. Amelinha chegou correndo e me empurrou. Rolei ali no meio de onde tudo começava. Senti a vida. Respirei. Esse foi o primeiro empurrão que ambas me deram.

Para mim só isso já estava bom. Correr. Rir. Cair. Respirar. Porém, logo ouvi um grito de
Amelinha: - "Levanta, moleza! Vai acabar ficando sem nenhuma."-. Nenhuma o quê? Pensei. Levantei meio tonta, não pelo tombo e sim do êxtase do momento. Felicidade também tonteia. Me ergui depressa. Não queria ficar para trás novamente. Nunca mais poderia.

Quando levantei meus olhos vi uma árvore ali no meio de todo aquele pasto. Só havia ela. Pensei em mim. Não podia chorar. Cheguei bem perto e
Amelinha colocou em minha mão o que eles comiam. Eram pitangas. Xerei. Levei até minha boca com um pouco de receio e mastiguei. Meu Deus! Nunca uma sensação se materializara tanto em mim. Senti o gosto da pitanga e o cheiro da liberdade.

Acho que nunca agradeci
Amelinha por isso...